DIÁLOGO 3
- Olha, eu mesmo não concordo.
- Não concorda ou não entende?
- Não... Como é que alguém fala que alguma coisa não existe e mostra logo a seguir?!
- Você está falando daquele texto adesivado na parede, bem grande?
- É, “as imagens não existem”. E, embaixo do texto, duas super imagens!
- O que que tem? Você acha mesmo que toda contradição auto-evidente entre termos implica em algum tipo de erro?
- É que eu olho as imagens e leio os textos e me irrita que os textos são cheios de dúvidas e as imagens são afirmações dos potenciais da linguagem fotográfica... a pujança das impressões, a escala, a demsidade do negro.
- Do ponto de vista da técnica sim, com certeza as imagens exemplificam a suculência da fotografia digital atual. Mas acho que não é sobre isso. Você reparou que essas imagens começam nos abraçando, campos côncavos cavernosos, mas terminam por nos repelir, impenetráveis? Seus quadrados centrais, suas portas de acesso à profundidade, estão fechadas.
- Hm. Eu fiquei olhando as vitrines, noutro dia.
- E aí?
- Tem outras imagens assim, que abraçam mas não deixam o olhar penetrar.
- Algumas imagens foram feitas na réplica perfeita da Caverna de Chauvet.
- Eu ouvi falar, mas é difícil de reconhecer.
- E, pensa bem, mesmo que você reconhecesse as imagens das pinturas rupestres mais antigas dentre as que conhecemos hoje. Mesmo que você estivesse lá dentro da caverna no sul da França. Você acha que essas gravações iriam se entregar para você? Acha que elas continuam vivas depois que aquelas pessoas sumiram sem deixar outros vestígios?
- Elas estão mortas. As imagens.
- E, ao mesmo tempo, nessas outras imagens que a artista faz, ali, elas estão vivas, mesmo que noutra encarnação. E lá dentro da caverna, elas nos assombram como coisas incontornáveis e inesquecíveis.
- São imagens-enigmas. Sombras e fantasmas.
- E presenças sem explicações. Acho que você está começando a entender.
- Mas eu posso não concordar?
- Sem dúvida.
Paulo Miyada é Curador do Instituto Tomie Ohtake