Conversa com Antonio Társis

Quando você começou o seu trabalho artístico?

Acredito que foi logo após a perda da minha mãe, quando tinha 13 anos. Fiquei muito no meu quarto e comecei a acumular coisas legais que eu achava, nesse mesmo tempo queria ser músico, estudei flauta e em seguida comecei a escrever, estava aberto a experimentar. Logo após conheci a pintura e foi maravilhoso, percebi que era o que eu gostaria de fazer pelo resto da vida, foi onde me encontrei, e a partir de então passei a conhecer outros artistas. A pintura, junto com as referências, foi direcionando o meu olhar, passei a observar com mais atenção texturas, o meu bairro, os objetos. Acumulava coisas no meu quarto e, por falta de tela, acabava pintando sobre superfícies que estavam próximas: placa de ônibus, madeira, papelão - o que foi bem legal, pois acabei incorporando processos de desconstrução em meu trabalho. Não tinha noção nenhuma sobre essa "coisa de pintura formal". O interesse por embalagens, carteira de cigarro, caixa de fósforo - que eu já vinha coletando e acumulando, surgiu da vontade de retratar esses objetos na pintura, a partir daí fui percebendo com mais noção e maturidade o que eu estava fazendo, que poderia utilizar os próprios objetos para os trabalhos. Daí surgiram as colagens e as fotos.

 

Poderia falar de alguns dos trabalhos expostos?

Acho que a obra que mais se aproxima de uma autobiografia é a instalação, que são as ampolas em concreto. Assim como na época em que minha mãe esteve doente, é algo que está em volta de mim novamente, pois o pai de minha irmã está em coma e utiliza medicações semelhantes, ampolas, seringas, etc. Minha mãe também esteve internada em casa, e minha irmã é técnica em enfermagem, então esses objetos estavam em torno de mim nesse período de pré-adolescência.

Paralelo a essa situação, minha família estava construindo uma casa em cima da qual morávamos na época, foi nesse momento que comecei a usar os sacos de entulho que serviam para carregar areia, brita, arenoso, entre outros.

 

Quando você começou a compreender o seu trabalho como artístico?

Quando tinha uns 18 anos comecei a conhecer fotografia, que reverberou na pintura e, em seguida, migrei para outras áreas. Comecei a observar as coisas que estavam no meu quarto, que eu recolhia nas rua e que eu via que a partir dali daria para fazer um trabalho.

 

E sobre as suas referências?

Tem um artista de Salvador chamado Jaime Figura. Ele é um artista bastante emblemático na cidade. Ele vive dentro de uma armadura; todo mundo se assusta quando o vê na rua. O bairro "Sete Portas" - que é onde moro desde os 6 anos, é uma das vias de acesso que leva ao Pelourinho, local onde o Jaime vive. Eu o via muito quando era pequeno. Além do Jaime, vejo em meus trabalhos linguagens que são próximas de artistas como Ayrson Heráclito, Arthur Bispo do Rosário, Caetano Dias, Marepe, Jac Leiner entre outros. O Zhang Huan e Paulo Nazareth, que conheci recentemente.

 

Como foi a sua inscrição no EDP?

Eu não me inscrevi para o EDP, eu tinha um material em mãos, um portfólio… Mandei para um edital mas não obtive resultado, o que me desestimulou um pouco. Quando soube do EDP,  através da minha companheira, achei difícil de ser selecionado então não me inscrevi,  porém, falei pra ela que havia me inscrito. Para a minha surpresa, me ligaram um tempo depois dizendo que eu havia sido selecionado. A minha companheira me inscreveu.

 

As suas fotografias se chamam “Cavalo”. Por que?

Esse título foi o próprio trabalho "que se deu". Quando montei as fotos, uma ao lado da outra,  percebi e tive a impressão que havia uma semelhança enorme com uma cabeça de cavalo. No decorrer do processo de pesquisa, descobri que cavalo é um termo usado no Candomblé, nos terreiros mais antigos. É o momento em que a pessoa entra em transe, que o santo monta na pessoa durante o ritual.

Pensei também sobre quando portugueses chegaram aqui: os indígenas nunca haviam visto um cavalo e essa foi a primeira impressão que tive ao ver as imagens. O logotipo do fósforo Guarany, indicando a presença indígena, e essa miscigenação do povo brasileiro e ritualística embutida ali nas fotografias, foi algo que esse trabalho foi me apresentando aos poucos. Ao pensar e conceber esse trabalho junto com a fotografia “Buxa de Prato” eu queria falar mais sobre o objeto do dia-dia que gera uma ação.